top of page

CRÍTICA: The Brown Bunny (2003) - Vincent Gallo

  • Foto do escritor: Gabriel Zügel Zeidan
    Gabriel Zügel Zeidan
  • 10 de jul. de 2020
  • 3 min de leitura

Atualizado: 20 de jul. de 2020

Uma jornada melancólica rumo à negação.


“The Brown Bunny” é um filme incisivo na maneira como a mise-en-scène captura o espectro emocional de seu protagonista, e coloca todas as engrenagens do universo ao redor a expressar o mesmo sentimento de constante melancolia que Bud emana em sua viagem. A câmera é invasiva na forma como ela captura as imagens, permanecendo em constantes primeiríssimos planos, causando consequentemente uma proximidade sufocante, mapeando pedaços do corpo do viajante, sempre analisando metodicamente qualquer expressão que este venha a emanar.


O escâner facial.


Se não nos encontramos prostrados no banco de carona da van, encarando o perfil do rosto do protagonista, ou seu braço sendo tocado pelo vento da estrada, estamos observando Bud lavando seu rosto, fitando seu reflexo no espelho, ou também presenciamos sua moto desaparecer no horizonte do deserto de sal. Cada plano, apesar de sua peculiaridade imagética, articula a favor do mesmo argumento, pois estas imagens que, na superfície, parecem vazias estão, na realidade, constantemente referenciando-se a todo o sentimentalismo proposto desde o princípio da jornada, uma melancolia inerente.


O mesmo sentimento, diferentes perspectivas.


Toda a premissa da obra se resume nesta sensação, no aprisionamento emocional que o protagonista sente em seu, já há muito tempo esvaído, relacionamento com Daisy, e as imagens refletem muito bem esta condição. A forma como Gallo constrói Bud, sua voz fraca, linguagem corporal retraída, é de sutileza peculiar, é um caso poderoso de um esmiuçamento imagético, que retratou toda a complexidade de uma figura, que é no geral, silenciosa.


Esta não seria uma crítica de “The Brown Bunny”, se eu não comentasse meu posicionamento sobre a infame felação, afinal, admito que meu primeiro contato com a obra foi ao escutar sobre a existência de tal cena. Reiterando que, desde o princípio, a mise-en-scène fora incisiva com a figura de Bud, não estranho o mesmo comportamento da câmera neste momento. Não há glorificação ou exacerbação, há na realidade, uma significância para o ápice da jornada do protagonista. O confronto com a figura que ocasionou todo o sentimento que baseou a estética da obra, a fragilidade que se transformou em ressentimento, uma momentânea libertação do enclausuramento emocional. Em minha concepção, é tão poético quanto, quiçá mais, a figura do motociclista desaparecendo no horizonte do deserto de sal.


A câmera íntima dá um passo adiante.


O que dá ainda mais significância a este momento foi o plot-twist, que talvez tenha sido o mais surpreendente que já vi. Se em comparação a um cineasta como o David Fincher, que muitos de seus filmes já possuem uma mise-en-scène que tendem a preparar o terreno para uma reviravolta, no caso de Vincent Gallo, toda a estética da obra apontava para outra direção, algo que possivelmente renegaria tal artifício, sendo uma obra inteiramente pessoal, relativamente simples em sua narrativa, resguardando suas peculiaridades ao âmbito visual. Abruptamente, no final de um terceiro ato já emocionante, a obra assume toda uma narrativa fantástica, que é, surpreendentemente, funcional.


A reviravolta não é funcional apenas pela surpresa momentânea. Toda a jornada assume um novo significado, o que era a superação de um relacionamento mal sucedido, transformou-se na total negação do luto. Em retrospecto, toda a razão da melancolia se torna mais ambígua, se antes Bud poderia ser considerado, perdão pelo jargão: um “gado”, agora ele se torna uma figura mais digna ainda de empatia. Dizem que existem cinco estágios do luto, sendo o primeiro a negação, e Vincent Gallo submerge seu protagonista nesse estágio inicial durante a esmagadora maior parte do filme, apenas para estrangulá-lo com os quatro remanescentes em poucos minutos.


Uma obra que erroneamente fora taxada como escória, e está limitada a enfeitar listas de “filmes com cenas reais de sexo”, é na realidade, uma reflexão poderosa sobre a total negação de um corolário.

Commenti


Post: Blog2_Post

Subscribe Form

Thanks for submitting!

©2020 por Cine 98. Orgulhosamente criado com Wix.com

bottom of page